terça-feira, 18 de maio de 2010

Preconceito silencioso

preconceito

Há quem diga que no Brasil, terra da mistura africana com Européia, não existe preconceito declarado ou descomedido como se há em outros países afora.

Ledo engano. Aqui como lá tem de tudo!

Tem por exemplo o preconceito silencioso, comedido, pesado e repensado de forma que não se torne direto contra quem se logra o direito de sentir tal sentimento.

Eu conheci de perto dois preconceitos deste tipo que por muitos anos me peguei pensando neles. Vire e mexe eu me deparava de novo com as mesmas formas de preconceitos. Não comigo propriamente dito, até porque o preconceito vindo de cor nunca tive, mas já sofri de outros pelo aspecto social. O que claro qualquer um que não se sinta excluído e que queira estar em todos ambientes passa.

Porque embora você ache que pode circular ou possuir qualquer coisa que seja comum a todos, a realidade não permite tal pensamento seja concluído.

Conheço pelo meu bairro uma senhora que é Africana, preservo aqui a menção da real nacionalidade dela por achar impróprio ser dito. Uma que não sou advogado dela, outra que não acho pertinente esmiuçar toda verdade.

Ela é uma negra, daquela bem negra mesmo. Uma pessoa que indo e vindo você reconhece sua raça. Cabelos longos, trançados tipo rastafári. Alta, esbelta, de corpo escultural, parece uma corredora de provas curtas. Enfim, uma belíssima mulher!

Tem uma filha semi-adulta, que puxa o mesmo padrão dela. O que pouco sei dela é que mora relativamente sozinha com a filha e tem um ex-marido em outro país que manda o sustento diário. Apesar de ela trabalhar e ganhar seu próprio dinheiro com suor de seu rosto.

Por acaso ou não ela trabalha representando aqui a sua cultura Africana com danças e costumes. E pelo que sei, parece bater um tamborzinho de vez em quando. Nada demais pra mim, mas vale pra agregar os valores que quero defender no texto.

Por ser, uma pessoa bem resolvida seria de bom crer, que ela estivesse bem acompanhada ou bem relacionada no meio em que vivemos.

Acontece porem, que sempre que passo, e a vejo no ponto de ônibus. Indo pro trabalho ou voltando, ou mesmo a passeio pelo comércio jamais a avistei com qualquer pessoa ao lado. Seja masculino ou feminino.

A pessoa dela, sendo bonita e tudo. Gosta de usar uma vestimenta meio que digamos... Espalhafatosa! Cores berrantes, (toda de amarelo banana, toda de verde, tipo marca texto, toda vermelho sangue...), coisas assim bem chamativas , com penteados igualmente proporcionais a roupa do momento (tipo trancinhas Vagner Love).

Fato exposto, digamos que o preconceito é meu, que reparo na roupas e nos trejeitos da senhora, e que de fato não existe preconceito nenhum com ela. Existe sim!

Por onde passo vejo homens que verdadeiramente quebram o pescoço por ela. Soltam gracinhas, falam barbaridades, etc. Na rua que moro, alguns vizinhos que também não vou citar, falam as mesmas coisas. Sejam eles solteiros ou não.

Uma pergunta que sempre fiz pra eles é:

- Por que não vai lá falar com ela?

-Dê uma carona pra ela! Você sempre vai pro centro, vai lá!

O que sempre ouço é hummm... Não dá... Saiu muito apressado! Não a conheço direito.

(?), Então o motivo é este? Ora bolas, então por que quando ela esta parada seja aqui na minha loja, ou na rua eu sempre vejo o celular dela tocando feita sirena escolar?? Não para nunca!

Obvio! Ela é boa pra sair ocultamente, não pra sair acompanhada.

Isso é o preconceito silencioso que eu falo. O cara pensa na família pensa nos amigos, pensa nos vizinhos, e pensa tanto que não toma atitude nenhuma. Sente vergonha e preconceito de encarar outra pessoa de tamanha distancia racial.

Por que eu falo isso? Simples! Eu já passei por isso.

Quando tinha 13 anos, eu conheci uma negrinha de igual idade, lindinha de cabelos de pranchinha, daqueles que se suspeitasse que fosse chover, ela jamais sairia de casa.

Ela, uma gracinha de pessoa, eu metido a infato-conquistador, resolvi virar hominho e levá-la pra minha casa.

Na época minha família todinha... Compreendendo avó, tios, tias, primos etc. Moravam todos muito próximos, casas separadas apenas.

Não deu outra! Fui levar minha pretinha pra todo mundo ver. Imagina ai que eu nem de longe acharia que haveria qualquer problema com isso.

Afinal, sou pobre, tenho irmão moreno do segundo casamento de minha mãe, então nada de mais né! Ledo engano!

Chegando em casa, entrei de mãos dadas e foram aqueles olhos de dezenas de parentes a me perseguir. Alguns ainda tinham sorriso no rosto por alguma anedota contada por uma das minhas tias que passava a tarde toda contada piada ou falando besteiras.

Só que aqueles sorrisos foram se desfazendo na medida em que eu entrava me destacando a tira-colo minha namoradinha de cor.

Foi um tal de silencio ensurdecedor, que me perdoe à contradição fonética! Eu já sentia que tinha peidado no ar. Só podia ser isso. Todos quase nem respiravam direito. Eram um tal de cochichado pra cá, chama fulano agora!

Eu meio que entrei, já falando, apresentando e saindo ao mesmo tempo... Tanto medo que tive daquele povo que parecia que não tava vendo dois namorados.  E sim um menino branco com uma negra-negra, se é que pode dar mais cor alguém desta raça.

Lógico, que eu não fiquei nem mais um minuto do que apenas o necessário pra apresentá-la ao povo dali. E já me piquei fora.

Mais tarde quando retornei magoado e chateado com aquele comportamento familiar, fiquei ouvindo coisas do tipo: (“ É uma boa pessoa”. “Até que é bonitinha”. “ Tem que aceitar né, é a escolha dele”. “ Nem fede, tava até cheirosa”. “ Já imaginou meus sobrinhos? Tudo de cabelo pixaim!!”).

Tive que escutar essas coisas de pessoas que até ali na minha vida, eram maravilhosamente belas em seus corações. E que por um erro ou ato falho, se deixavam espantar ao ponto de cometer asneiras de pensamentos hediondos como esses citados.

Esse preconceito talvez já tenha passado ou não. Só sei que não agüentei três dias depois daquele fatídico dia!

Terminei com uma desculpa qualquer, morrendo de vontade de me esconder por achar na época que tomei uma decisão errada de gostar de alguém tão diferente.

Ainda bem que hoje resolvi escrever sobre isso. Lavei minha alma com mais uma sujeira de tantas que o ser humano arrasta pela vida.

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